segunda-feira, 22 de março de 2010

Futura Evolução Humana: Eugenia no século XXI

por John Glad

A versão resumida do original deste livro em inglês pode ser baixada gratuitamente de
http://whatwemaybe.org

Introdução
“Estou com vocês, homens e mulheres de uma geração
ou todas as demais gerações a contar deste momento”.
WaltWhitman, “Crossing Brooklyn Ferry”
A Grande Guerra e a Depressão subsequente minaram a mentalidade do Império e os privilégios de classe, deixando um vácuo preenchido por um clima intelectual que proclamava a igualdade de todos os seres humanos, não simplesmente como princípio ético, mas como fato biológico. A sociedade ocidental do século XX passou a ser dominada por uma ideologia nova e unificada. Freudianismo, Marxismo, Behaviorismo de B.H. Skinner, história cultural de Franz Boaz e antropologia de Margaret Mead enfatizavam a maravilhosa "plasticidade" e mesmo a "capacidade de programação" do Homo sapiens. Repetidamente era explicado que a mente humana pouco difere em suas qualidades inatas, e que apenas a educação e a cultura explicam as diferenças entre nós. O software é tudo; o hardware é idêntico e, portanto, insignificante. O caminho para a utopia repousa apenas sobre o aprendizado melhorado.
No último terço do século XX, mesmo enquanto os cientistas promoviam ativamente a teoria da evolução, eles evitavam, em grande margem, o tópico da evolução da humanidade atual e futura. É notável que essa premissa tácita da estase tenha coincidido com a revolução em nossa compreensão da genética como processo em andamento. Agora essa censura foi levantada e mesmo os adversários mais implacáveis das variações significativas na genética humana admitemque o antigo diálogo darwinista foi retomado.
Os temas em questão mostram-se tão repletos de consequências emtodos os níveis que, mesmo pequeno como é o grupo de pessoas preocupadas com a futura composição genética da humanidade, uma única fagulha ideológica nessa área tem o poder de detonar uma conflagração total e absoluta, de forma que a hostilidade com frequência elimina a discussão racional. Mas, não importa quanto a sociedade fica incomodada com esses temas, eles de fato estão diante de nós, exigindo pelo menos reconhecimento, senão solução. Neste livro, eu procuro apresentar os fundamentos científicos e éticos do intervencionismo genético.
Por mais que nós humanos nos orgulhemos de nossas realizações, pouco nos aproximamos da resolução das grandes questões da existência do que quando morávamos em cavernas. O prolongamento do tempo infinitamente para trás ou para a frente é tão inimaginável quanto é o tempo ter início ou fim. Psicologicamente, porém, precisamos de um mapa - um conceito de existência e de nosso lugar no universo – e, deste modo, nos ocupamos emelaborar mitos para preencher o vácuo que achamos tão intolerável. Para ser duradoura, uma visão do mundo precisa primeiro nos explicar o universo e, depois, aliviar nossos medos e satisfazer nossos desejos. A lógica não é um prerrequisito. O mito pode até se contradizer - sem contar que pode estar emdesacordo como mundo real.
Independentemente de quando ou onde vivemos, inevitavelmente percebemo-nos como o Império do Centro ou o Médio Império e, sorrimos condescendentemente aos mitos elaborados por outras culturas, ou guerreamos com eles para submetê-los a nossa (unicamente correta) visão de mundo. E se somos melhores na arte das armas, geralmente somos capazes de persuadir aqueles que dominamos fisicamente da superioridade de nossos mitos sobre os deles.
Até meados do século XIX, o mundo ocidental aceitou a interpretação literal do Livro de Gênesis, mas, em seguida, a teoria da evolução apresentou explicação radicalmente diferente sobre as origens do homem. Tentando reconciliar religião e ciência, a sociedade forjou uma nova mitologia que, sem surpresas, é cheia de contradições. Eis algumas delas:
a) Enquanto outras espécies de animais e plantas podem sofrer mudanças significativas em algumas gerações, nós afirmamos que milhares de gerações, sob condições radicalmente diferentes de seleção e de relacionamentos seletivos, têm deixado apenas mudanças genéticas muito superficiais em nossa espécie.
b) Os intelectuais (embora não o homem comum) estavam firmemente convencidos de que somos produto da evolução, mas estavam igualmente arraigados na estranha suposição de que os seres humanos são a única espécie que não é mais afetada por esse processo.
c) Mesmo que a sociedade premie capacidades ou sagacidades em praticamente qualquer forma de atividade, tornou-se moderno afirmar que esses fatores não desempenham nenhum papel na formação das classes sociais, tidas inteiramente como resultado de sorte e privilégio. De fato, os estudiosos que dominam o mercado editorial e a academia negaram a própria existência da variação inata do QI nas populações humanas.
d) Apareceu um imenso setor de testes acadêmicos, mas seus achados foram amplamente declarados como sendo somente aproximados, mas carentes de qualquer tipo de validação.
e) Com a transição para famílias menores, os cientistas têm observado que geração após geração dos intelectualmente favorecidos estão deixando de se substituírem – exatamente como era temido pelos primeiros eugenistas – no entanto, a sociedade aceitou o fenômeno como natural.
f) Estamos nos tornando cada vez mais bem-sucedidos na implementação de um processo chamado de “medicina” para a eliminação da seleção natural, mas continuamos alegremente indiferentes à ameaça existencial que esses sucessos de curto prazo representam para as futuras gerações.
g) Trabalhando com afinco na decifração do mapa do genoma humano, continuamos a aplicar critérios morais para comportamentos, que logo se tornariam explicáveis cientificamente.
h) Como em todas as outras espécies animais, enquanto nossa conduta social esteve necessariamente centralizada em rituais de acasalamento, nossa percepção desse processo permaneceu dominada por uma miríade de tabus camufladores e fetiches.
i) Criamos uma sociedade de castas genéticas que coopta talentos nascidos nas classes menos favorecidas, exploramos e manipulamos com eficiência essas castas, enquanto, ao mesmo tempo, proclamamos a igualdade de oportunidades como nosso slogan.
j) A igualdade de oportunidades foi proclamada como a grande meta da sociedade, mas uma das causas principais do desequilíbrio das oportunidades – a diferença da dotação genética entre as pessoas - estava fora de cogitação como alvo da engenharia social.
k) Libertando-nos (muito temporariamente) das amarras da seleção natural e das limitações dos recursos naturais, nós nos recusamos a reconhecer que nos tornamos a espécie que perfeitamente se encaixa na definição de doença, causando estragos a nós mesmos e a nossas espécies irmãs numa agressão maciça ao hospedeiro que parasitamos – o planeta. Mas, quem quer se ver nesse papel?
l) Criamos uma economia insustentável, dependente da exaustão dos recursos, no entanto, proclamamos níveis ainda maiores de consumo como a meta da sociedade.
m) Defendemos a liberdade de expressão, ao mesmo tempo em que denunciamos impiedosamente qualquer opinião na área da genética humana considerada ofensiva por qualquer segmento significativo da sociedade.
Dessa forma, a revolução na tecnologia foi acompanhada, não pela eliminação do mito, mas pela criação de novos mitos equivalentes à negação da biologia. O dar e receber do processo político foi determinado necessariamente pelo poder relativo dos participantes, de modo que as gerações futuras não foram levadas em consideração na tomada de decisões.
Apesar da opinião popular e dos preconceitos, é impossível fugir dos fatos da ciência. Enquanto você lê esta frase, a humanidade terá evoluído geneticamente. Há espécies como a do peixe celacanto que – incrivelmente – sobrevivem há mais de 400 milhões de anos, mas eles são a exceção rara. O Homo sapiens é um elo recente na cadeia evolutiva, e as condições que norteiam a seleção desta população passaram por transformações revolucionárias ao longo do século passado.
Finalmente, temos que decidir o grau de satisfação que sentimos enquanto espécie. Este é o grande divisor de águas, separando aqueles a favor da intervenção genética dos que se opõem a ela. Independentemente de nossas atitudes pessoais, não há como negar que enquanto a loteria genética produziu de fato muitos vencedores, há muitos menos afortunados.
O movimento eugênico, que pode ser entendido como ecologia humana, há muito considera-se como um lobby para as futuras gerações, argumentando que, embora seja verdade que não deveríamos ser presunçosos em nossa capacidade de prever o futuro, podemos definir o que queremos – bebês inteligentes e saudáveis que crescerão para se tornar adultos emocionalmente equilibrados e amplamente altruístas.
Ora, quando a maioria das pessoas vive muito além de sua idade reprodutiva, não são aqueles que sobreviveramao terrível processo da seleção natural que habitarão o planeta no futuro, mas aqueles que têm a  maior prole. Agora temos seleção pela fertilidade emvez de pela mortalidade – uma mudança revolucionária.
No plano teórico, hoje – finalmente – concordamos que igualdade de oportunidades é um objetivo desejável. Ao mesmo tempo, porém, nos encontramos presos a um etos social que insiste que não apenas deveríamos gozar de direitos iguais, mas também que somos praticamente idênticos, diferindo apenas na criação.
Compassiva e alegremente, cada um de nós é um indivíduo único, e essa singularidade se estende aos grupos étnicos e nacionais que constituímos. Não somos máquinas idênticas com softwares diferentes. Sem exceção, todos os grupos étnicos produziram tanto vencedores como perdedores na loteria genética. Os intervencionistas argumentamque é nossa obrigação moral fazer o máximo para transmitir aos nossos filhos – não a mesma herança – mas a melhor, a única herança possível para cada um deles. Os anti-intervencionistas mostram que, ao quebrar o bastão precioso passado de geração a geração, podemos facilmente produzir um desastre irreparável. Porém, não tomar decisão tambémé uma decisão.
Muitas de nossas decisões cotidianas estão repletas de consequências genéticas. Quem está tendo bebês, e quantos? Tudo que influencia a fertilidade é um fator na nova seleção. Isso pode incluir um passeio à farmácia mais próxima para comprar dispositivos contraceptivos, a ida a uma clínica de aborto ou a decisão de reduzir ou mesmo renunciar à procriação em prol de avanços na carreira e na formação. Ao negar creches gratuitas e apoio financeiro infantil para todos, exceto as populações carentes, o governo incentiva alguns grupos e desestimula outros a procriar e esta política já se tornou tambémumfator grave na seleção genética.
Os eugenistas argumentam que devemos reconhecer nosso lugar no mundo físico – como criaturas biológicas. Para sobreviver como espécie com maior significado filosófico do que os outros animais, eles acreditam que, na área da reprodução, temos que subordinar nossos interesses àqueles das gerações futuras e começar a controlar nossas populações de acordo com princípios incontestáveis aplicados às outras espécies. Em resumo, eles apoiam substituir a seleção natural pela seleção científica. Nas palavras de Sir Francis Galton, o “pai” da eugenia e da estatística: O que a natureza faz cega, lenta e impiedosamente, o homem pode fazer prudente, rápida e cuidadosamente. Como está em seu poder, torna-se seu deve trabalhar nessa direção.
Este é um livro sobre o sentido da vida, da inteligência e do nosso lugar no universo. Baseia-se em uma filosofia racional de vida e de amor por nossas crianças, na consciência dos fardos e responsabilidades da paternidade. É expresso em um espírito de amizade igualitária, para homens e mulheres preocupados e de  boa vontade – os proponentes e os oponentes do movimento eugênico. Esperançosamente, muitos deles compartilharão os mesmos valores, esperanças e medos. Se nada mais, deveríamos concordar com o direito de discordar.
Repleto de história, valores e emoções, o movimento eugênico vê a si próprio fundamentado na ciência, mas não está limitado a ela. Aqui, tentarei ligar algumas áreas do conhecimento numa abordagem sincrética. Peço a compreensão do leitor na apresentação dessas áreas, que podem parecer discrepantes, porém, qualquer visão de mundo séria e de amplo espectro é necessariamente eclética.
A humanidade penetrou nos primeiros estágios da revolução no conhecimento geral dos mecanismos genéticos, novas biotecnologias e na explicação científica de áreas da saúde humana e comportamentos previamente analisados sob o prisma moral. O espírito do iluminismo não pode ser devolvido à lâmpada da ignorância. A perspectiva de, em poucos anos, ter nas mãos o esboço humano completo é impressionante, e devemos assumir que as futuras descobertas no campo da genética nos darão capacidades que nem  podemos imaginar agora. A seleção de embriões para se obter os genes desejáveis, a engenharia genética na linha germinativa e a clonagem de crianças geneticamente idênticas a partir de células cultivadas se tornarão possíveis nos próximos dez a quinze anos. As discordâncias entre o que é atribuído à natureza e o que é à educação parecerão estranhas, e teremos que nos perguntar como espécie o que fazer depois, como  alcançar, se não a utopia, pelo menos algo mais perto disso do o que temos agora ou, no mínimo, como sobreviver.
Adeptos da eugenia veem sua causa como parte da luta pelos direitos humanos – os direitos daqueles que virão depois de nós. Como Martin Luther King, eles argumentam, podemos bem imaginar se jamais alcançaremos a Terra Prometida. Talvez não haja um objetivo final, apenas a busca, porém, devemos a nossos filhos iniciar a jornada, fazer o melhor para assegurar que eles nasçam melhores pessoas do que somos, e que eles herdemmais nossas boas qualidades e menos nossas imperfeições.

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